Imprensa

Líderes da ONU pedem mais ação para acabar com o racismo e a discriminação

Compartilhe

Esta terça-feira (16) marcou a abertura na ONU da terceira sessão do Fórum Permanente de Afrodescendentes, que reúne ativistas antirracismo, pessoas defensoras dos direitos humanos, delegações governamentais e outros atores.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, celebrou as conquistas e contribuições de pessoas afrodescendentes de todo o mundo em sua mensagem de vídeo ao Fórum, mas também reconheceu a existência de discriminação racial e desigualdades que as pessoas negras continuam a enfrentar.

“Agora devemos aproveitar esse momento para impulsionar mudanças significativas, ao garantir que as pessoas afrodescendentes desfrutem da realização plena e igualitária de seus direitos humanos; ao intensificar os esforços para eliminar o racismo e a discriminação, inclusive por meio de reparações; e ao avançar em direção à plena inclusão de pessoas afrodescendentes na sociedade de forma igualitária”, disse Guterres.

O chefe da ONU afirmou, ainda, que o estabelecimento do Fórum Permanente demonstra uma dedicação da comunidade internacional para abordar essas injustiças, mas que precisa ser respaldada por mudanças significativas para pessoas afrodescendentes em todo o mundo.

‘Poder de convocação formidável’

A Alta Comissária adjunta para os Direitos Humanos, Nada Al-Nashif, elogiou o fórum por seu “poder de convocação formidável” ao realizar uma terceira sessão de alto nível menos de dois anos após entrar em operação.

Ela elogiou os 70 eventos paralelos planejados pelo fórum, focando em justiça climática, educação, saúde para pessoas afrodescendentes, e afirmou que isso mostra um “esforço notável, que amplia o alcance e o impacto de nosso compromisso coletivo”.

Al-Nashif instou os Estados-membros a participarem das discussões e agirem com base nas recomendações derivadas delas.

“Só assim podemos garantir que todos os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais das pessoas afrodescendentes possam ser plenamente realizados sem discriminação ou viés”.

Década de Afrodescendentes deve ser estendida

Al-Nashif disse que o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, apoia a extensão da Década Internacional de Afrodescendentes – um período proclamado pela Assembleia Geral em 2015 para focar em reconhecimento, justiça e desenvolvimento.

Durante o Fórum Permanente, uma conversa será centrada em limitações e expectativas de realização da segunda década internacional solicitada.

“Estamos ansiosos pelo resultado das discussões desta sessão; e acompanharemos as discussões intergovernamentais relacionadas à Década Internacional ao longo deste ano”, disse Al-Nashif.

Todos os relatórios do Fórum Permanente serão apresentados na 57ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU em setembro, bem como na nova sessão da Assembleia Geral da ONU, que começa neste mês.

Uma luta por mudança

A Alta Comissária adjunta disse que seu escritório continua procurando maneiras de garantir que “a participação significativa, inclusiva e segura de afrodescendentes na vida pública seja essencial na luta contra o racismo sistêmico”.

Sobre o Fórum Permanente de Afrodescendentes: 

O Fórum Permanente foi criado em 2021 pela Assembleia Geral da ONU, como parte das atividades da Década Internacional de Afrodescendentes (2015-2024).

O Fórum Permanente contribui para a inclusão política, econômica e social da população afrodescendentes em todo o mundo, além de identificar e analisar boas práticas, desafios, oportunidades e iniciativas para a promoção dos direitos humanos das pessoas afrodescendentes.

O Fórum Permanente também tem a importante tarefa de discutir a elaboração de uma Declaração das Nações Unidas sobre a promoção, proteção e respeito pleno aos direitos humanos das pessoas afrodescendentes.

Em sua terceira sessão, o Fórum terá quatro painéis temáticos de discussão:

  • Reparações, Desenvolvimento Sustentável e Justiça Econômica
  • Educação: Superando o Racismo Sistêmicos e os Danos Históricos
  • Cultura e Reconhecimento
  • A Segunda Década Internacional de Afrodescendentes: Expectativas e Desafios

Para saber mais, visite a página da Década e acesse a biblioteca virtual, em português: https://decada-afro-onu.org/ 

 

Fonte: Geledés

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Aprovada no Senado, PEC das Drogas ameaça a vida da juventude brasileira

Compartilhe

Na última terça-feira (16), o Senado Federal deu um passo que representa um retrocesso histórico ao aprovar, em dois turnos – burlando o regimento,  a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2023, que torna crime o porte e a posse de drogas, independentemente da quantidade. A medida, proposta pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), recebeu 53 votos favoráveis e 9 contrários no primeiro turno, e 52 votos favoráveis e 9 contrários no segundo.

A PEC 45/2023 vai contra a declaração da ONU, endossada por pelo menos 60 países, que pede políticas centradas na redução de danos, justiça e direitos. Sem critérios claros para distinguir usuários de traficantes, a tendência é que o encarceramento em massa no país seja agravado, remetendo à política de drogas vigente na ditadura militar. Os impactos devem ser ainda mais graves para pessoas negras e pobres, que são as mais afetadas pelo já sobrecarregado sistema prisional brasileiro.

Desde 1999, a atividade de tráfico de drogas está listada entre as piores formas de trabalho infantil pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Crianças e adolescentes envolvidos nessa atividade são, na verdade, vítimas da criminalidade e da ineficiência do Estado, da família e da sociedade em protegê-los e assegurar-lhes seus direitos fundamentais.

Segundo o último levantamento do SINASE (2023), o tráfico de drogas é o primeiro ou segundo ato infracional com maior incidiência em seis dos onze Estados que participaram da pesquisa. Isso demonstra que as medidas de proteção que deveriam ser aplicadas aos adolescentes envolvidos com a comercialização de substâncias ilícitas são frequentemente desconsideradas, impedindo que essa juventude seja protegida e entendida como vítima do trabalho infantil.

A ‘PEC das Drogas’ é uma medida racista, que viola direitos fundamentais e agrava desigualdades sociais e econômicas.

Diga NÃO à PEC 45!

 

Fonte: Coalizão Pela Socioeducação

Para saber mais sobre o direitos das crianças, conheça a newsletter Infância na Mídia.

 

Comunidade quilombola aciona Comissão Interamericana por tragédia de Mariana

Compartilhe

Uma comunidade quilombola próxima ao município de Mariana (MG) solicitou uma audiência à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) para denunciar os casos de racismo ambiental e as violações de direitos humanos enfrentados pelos povos tradicionais após o rompimento da barragem do Fundão, em 2015.

Segundo a Associação Quilombola da Comunidade Santa Efigênia e Adjacentes, que representa os povos tradicionais da região, os habitantes vivem uma situação “gravíssima” desde então. A estrutura pertencia à Samarco, consórcio formado entre as empresas Vale e BHP.

Os moradores relaram que, além dos danos ambientais imediatos, a tragédia causou perturbações climáticas regionais que resultaram em perdas econômicas significativas e fragilização de culturas e tradições para as comunidades afetadas.

Além disso, os povos tradicionais da região expressaram preocupação de que o Estado tem falhado reiteradamente em sua obrigação de responsabilizar as empresas envolvidas, deixando de prestar assistência à população afetada e de garantir proteção contra danos ambientais persistentes.

O documento também aponta que, apesar da comunidade estar localizada a cerca de 60 quilômetros da barragem e ter enfrentado impactos devastadores, a Fundação Renova, responsável pelas reparações, não reconhece a região da comunidade como parte do território afetada pela tragédia.

Ainda segundo a associação, outras comunidades atingidas passaram a habitar dentro do território quilombola, e embora uma estação de tratamento de água tenha sido construída na área em que vivem, eles ainda não têm acesso ao saneamento básico. O pedido enfatiza que medidas necessárias, como análises técnicas da água e do meio ambiente da região, ainda não foram tomadas.

 

Fonte: Alma Preta

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Observa disponibiliza 3 livros sobre brincadeiras e jogos infantis

Compartilhe

A plataforma Observa – Observatório do Marco Legal da Primeira Infância disponibiliza 3 livros sobre brincadeiras africanas e jogos infantis para download.

Os livros estão em formato digital, e apresentam uma série de brincadeiras da cultura africana e afro-brasileiras, da cultura popular do Brasil e orientações de jogos para a primeira infância.

A Biblioteca da Primeira Infância do Observa, é uma iniciativa da Rede Nacional Primeira Infância e da ANDI – Comunicação e Direitos.

 

Livro 1 – Catálogo de Jogos e Brincadeiras Africanas e Afro-Brasileiras

O Catálogo de jogos e brincadeiras africanas e afro-brasileiras foi produzido com base no projeto de pesquisa aplicada intitulado Nô bá brinca, vamos brincar, ahi tlhangui? 

O projeto foi contemplado pelo Edital Equidade Racial do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) em 2020.

Este catálogo foi produzido com base nessa recolha de dados e esperamos que seja utilizado em redes municipais de educação básica – em especial na etapa da educação infantil – dos países envolvidos. 

 

Livro 2 – Jogos e brincadeiras das culturas populares na Primeira Infância

A presente publicação tem o objetivo de mostrar um pouco das brincadeiras e brinquedos da cultura popular e tradicional do Brasil, para a primeira infância. 

Brincar é um direito de toda criança, garantido no Artigo 31 da Convenção dos Direitos da Criança (CRC), que assegura que cada Estado Parte “reconhece o direito da criança ao descanso e lazer, a participar do brincar e das atividades recreativas [….] e a participar livremente da vida cultural e das artes.”

As atividades desta cartilha estão apresentadas por faixas etárias, desde o nascimento, até os cinco anos. Todas podem ser oferecidas a crianças de norte a sul do Brasil; irão possibilitar momentos de alegria e estímulo ao desenvolvimento infantil.

Livro 3 – Cardápio de brinquedos e brincadeiras

O Cardápio de Brinquedos e Brincadeiras desenvolvido pela Organização Plan International Brasil em parceria com a NIVEA tem como objetivo orientar pais, mães, cuidadores, cuidadoras, professoras e professores, agentes comunitários de saúde e gestores da rede intersetorial da Primeira Infância na organização de um ambiente lúdico, no uso de brinquedos, materiais e brincadeiras adequadas para as crianças de 0 a 6 anos.

Perto da universalização do acesso à Internet, Brasil ainda tem maioria da população com baixa conectividade significativa, revela novo estudo

Compartilhe

Embora o país caminhe para a universalização do acesso à Internet, com 84% de seus habitantes de 10 anos ou mais usuários da rede, somente 22% dos brasileiros a partir dessa idade têm condições satisfatórias de conectividade. Para a maioria (57%), a realidade é menos positiva. A constatação faz parte do estudo inédito Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil“, lançado nesta terça-feira (16), em Brasília (DF), pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). Conduzido pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br/NIC.br), o levantamento oferece uma avaliação detalhada das lacunas existentes no acesso, no uso e na apropriação da Internet no contexto nacional. O material também será apresentado durante reunião do G20 neste mês.

O estudo propôs um método para mensurar a qualidade e efetividade do acesso da população às tecnologias digitais, a partir da construção de uma escala derivada do processamento de indicadores da TIC Domicílios – a mais abrangente pesquisa amostral domiciliar especializada em tecnologias da informação e comunicação feita no país. Como referencial analítico, recorreu-se à ideia de “conectividade significativa”, um conceito em construção e apoiado no entendimento de que a conexão deveria permitir utilização satisfatória de vários serviços na Internet, possibilitando o aproveitamento das oportunidades no ambiente online.

Foram definidos nove indicadores, agrupados em diferentes dimensões (acessibilidade financeira, acesso a equipamentos, qualidade da conexão e ambiente de uso). Quatro descrevem atributos individuais e os outros 5 refletem características dos domicílios. São eles: custo da conexão domiciliar, plano de celular, dispositivos per capita, computador no domicílio, uso diversificado de dispositivos, tipo de conexão domiciliar, velocidade da conexão domiciliar, frequência de uso da Internet e locais de uso diversificado.

A partir da soma das 9 variáveis selecionadas, os pesquisadores estabeleceram diferentes níveis de conectividade significativa, o que resultou numa escala de 0 a 9 para cada pessoa presente na amostra, na qual o score 0 indica ausência de todas as características aferidas, enquanto o 9 denota a presença de todas elas. Dentre as 4 dimensões analisadas, foram os indicadores de acessibilidade financeira que apresentaram o pior desempenho, seguidos pelos de acesso a equipamentos e de qualidade da conexão.

“A complexidade do cenário atual, marcado por rápidos avanços tecnológicos, tem exigido um alargamento da compreensão sobre inclusão digital. Considerar o nível de conectividade de um país pela quantidade de usuários de Internet entre seus habitantes não é mais suficiente. Os debates mais recentes no Brasil e no exterior sobre a questão enfatizam a necessidade de pensar na conectividade de maneira abrangente. Para entendermos melhor nossa realidade, decidimos dar um passo além e, numa iniciativa inédita, investigamos a qualidade da conectividade dos brasileiros por meio de diferentes recortes”, destaca Alexandre Barbosa, gerente do Cetic.br|NIC.br.

“Não estamos defendendo que se trate de uma abordagem única e exclusiva para medir o fenômeno, mas de um exercício analítico, e que terá de ser revisado no futuro. Sabemos que os condicionantes de qualidade de acesso mudam à medida que as tecnologias se modificam, e os usos que as pessoas fazem delas variam. Nossa intenção é contribuir com o debate em nível global a partir de uma experiência concreta”, acrescenta Barbosa.

Maioria na pior faixa

Os resultados por faixas de conectividade revelam que o maior grupo observado é o com scores de até 2 pontos, e que corresponde a um terço (33%) da população. Se essa proporção for somada com a do grupo que ocupa a faixa de 3 a 4 pontos (24%), é possível afirmar que 57% dos brasileiros estão em situação de baixa conectividade significativa. Somente 22% alcançaram a maior faixa (de 7 a 9) e 20% ficaram na de 5 a 6 pontos.

Considerando exclusivamente como usuários aqueles que se conectaram à Internet ao menos uma única vez nos 3 meses anteriores à sondagem), as porcentagens são: 23% (0 a 2 pontos), 27% (3 a 4 pontos), 23% (5 a 6 pontos) e 26% (7 a 9 pontos). Já os não usuários obtiveram os seguintes resultados: 86% (0 a 2 pontos), 11% (3 a 4 pontos) e 3% (3 a 4 pontos).

“Mesmo não usuários diretos de Internet podem apresentar algum grau de conectividade, caso convivam ou residam em local com conexão, por exemplo, o que aumentaria as chances de esse indivíduo ter algum aproveitamento da rede, ainda que de maneira indireta, por meio da ajuda de parentes ou conhecidos”, explica Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Cetic.br e responsável pelo levantamento.

Apesar do cenário desafiador, houve uma melhora gradativa ao longo da série histórica da TIC Domicílios, que vem sendo realizada pelo Cetic.br de forma ininterrupta há 19 anos. A análise retrospectiva dos níveis de conectividade significativa identificou uma redução na disparidade entre os grupos que ocupam os extremos da escala. Em 2017, 48% da população tinham score entre 0 e 2 e apenas 10% estavam na faixa de 7 a 9 pontos – uma distância de 38 pontos percentuais. Em 2019, a diferença entre eles recuou para 29 p.p.; em 2021, para 22 p.p.; e, em 2023, para 11 p.p.

“Esse quadro sugere uma tendência positiva, mas ainda que tenha sido detectada uma melhora progressiva, é preciso celeridade para reduzir as disparidades de conectividade no Brasil, que são reflexo direto das desigualdades que marcam a estrutura social do país”, alerta a coordenadora.

Camadas e dimensões

O estudo incorporou análise em duas camadas, considerando dimensões territoriais, sociodemográficas e socioeconômicas, e aferindo a qualificação para o uso da Internet, bem como os tipos de atividades desenvolvidas na rede. “Com a primeira camada, tentamos identificar as brechas em inclusão digital. Já a segunda diz respeito à avaliação dos níveis de conectividade por habilidades digitais e atividades online, o que nos permite avançar na compreensão sobre as condições da população para o aproveitamento das oportunidades e o gerenciamento dos riscos postos pelo mundo digital. Juntas, elas nos permitiram compreender as nuances da conectividade digital no país”, comenta Graziela Castello.

A dimensão territorial (com recortes por regiões do país, áreas rurais x urbanas, unidades da federação e porte dos municípios por tamanho da população) abrange a distribuição geográfica do acesso e sua qualidade, enquanto a dimensão sociodemográfica analisa a conectividade em relação a presença de crianças no domicílio, idade, sexo, cor e raça. Já a dimensão socioeconômica considera a relação entre a conectividade e características dos indivíduos tais como: classe socioeconômica, presença na força de trabalho, escolaridade e ser (ou não) beneficiário de programa social. A avaliação feita com base nesses aspectos mostrou que as piores condições para conectividade significativa estão concentradas nos grupos populacionais historicamente excluídos.

Principais resultados

Norte e o Nordeste têm as piores condições de conectividade significativa, com apenas 11% e 10% da população, respectivamente, na faixa entre 7 e 9 pontos, e 44% e 48% (na mesma ordem), ocupando o outro extremo da escala (até 2 pontos) – a média nacional é de 33%. Em contrapartida, Sul (27%) e Sudeste (31%) registraram os melhores índices, sendo as únicas regiões no país em que a quantidade de habitantes na maior faixa é superior do que aquela na pior faixa.

A área e o porte do município de residência também demonstram forte associação com o nível de conectividade significativa. Quanto maior a cidade, melhor o desempenho. Naquelas com até 50 mil habitantes, 44% da população encontra-se na pior faixa da escala. Nas com mais de 500 mil habitantes, por sua vez, a proporção negativa cai quase pela metade (24%). Em relação à área, enquanto 30% dos habitantes das localidades urbanas estão no grupo de pior faixa (até 2 pontos), 54% da população em zonas rurais encontra-se nessa condição.

No recorte de faixa etária, o levantamento confirma a maior vulnerabilidade à exclusão digital dos idosos: 61% dos brasileiros com 60 anos ou mais apresentam scores mais baixos (até 2 pontos) de conectividade significativa, proporção muito acima da verificada no país de maneira geral (33%). E, diferentemente do que sugere o senso-comum, os dados desmentem a ideia de que os mais jovens apresentariam melhores indicadores no mesmo quesito. O estudo revela que somente 16% e 24% daqueles com idades entre 10 e 15 anos e 16 e 24 anos, respectivamente, estão na faixa mais alta (entre 7 e 9 pontos). Os níveis mais elevados ocorrem justamente entre os grupos etários de maior incidência no mercado de trabalho (entre 25 e 44 anos).

“O estudo questiona a ideia de que os gargalos para inclusão digital seriam sanados por uma possível transição geracional, uma vez que os jovens já seriam super conectados. Quando olhamos para os usuários de Internet de maneira geral, isso se confirma, mas ao complexificarmos a análise e entendermos a conectividade como um todo, fica claro que uma parcela importante desse grupo possui condições precárias de conectividade e vai ingressar no mercado de trabalho com uma desvantagem grande. A realidade de um jovem que mora na periferia e não tem qualidade de conexão é muito distinta da de um jovem da mesma idade que tem melhores condições. Essas diferenças potencializam desigualdades já existentes”, alerta Graziela Castello.

A proporção de pessoas com melhor conectividade significativa também é consideravelmente maior entre os entrevistados do sexo masculino (28%), na comparação com os do sexo feminino (17%) – 11 p.p. de diferença. O estudo enfatizou que examinados isoladamente, alguns indicadores de acesso às tecnologias não evidenciam as desigualdades entre homens e mulheres. Por exemplo, a prevalência de usuários de Internet no Brasil mostra distâncias pouco significativas entre esses dois grupos. Contudo, uma análise combinada de indicadores revela condições de conectividade mais precárias para a população feminina, sublinhando barreiras pré-existentes para sua inclusão produtiva, equiparação em renda, incidência pública e participação na vida social, política e econômica do país.

Essa desigualdade também fica evidente na análise dos dados com base na autodeclaração de cor ou raça dos respondentes. Entre os brancos, 32% estão na faixa mais alta (score entre 7 e 9). Já entre pretos e pardos, a porcentagem cai para 18%.

A pesquisa identificou ainda que, quanto maior o grau de escolaridade, menor a proporção de brasileiros com score entre 0 e 2 e maior a proporção daqueles na faixa entre 7 e 9. Entre os que possuem até o Ensino Fundamental I, a maioria (68%) está na pior faixa de pontuação, e apenas 3%, na melhor. O quadro se inverte entre os com Ensino Superior: apenas 7% obtiveram a pior pontuação, enquanto 59% ficaram com os maiores scores.

Grande distância também se revela na comparação entre extratos sociais. Na classe A, a grande maioria (83%) está na melhor faixa de pontuação e apenas 1%, na pior. Por outro lado, entre as pessoas nas Classes DE, a realidade é totalmente distinta: apenas 1% delas está na melhor faixa e a maioria (64%), na pior.

Qualificação para o uso da Internet

Os pesquisadores analisaram a relação entre os diferentes níveis de conectividade significativa e os tipos de uso da Internet e a qualificação dos brasileiros para utilizar a rede. A avaliação foi feita com base nas habilidades digitais e as atividades realizadas no ambiente online.

Processados para o total de usuários de Internet em território nacional – não para a população como um todo -, os resultados mostram uma associação direta entre conectividade significativa e habilidades digitais. Quanto melhores os scores de conectividade significativa, maiores as competências técnicas para lidar com as tecnologias, evidenciando que aqueles com condições de acesso mais frágeis são justamente os com menos competências para mitigar os riscos associados aos usos da rede.

Os pesquisadores analisaram também 14 atividades diferentes, agrupadas em três grandes tipos: “comunicação e entretenimento”, “busca de informações” e “atividades transacionais” – estas últimas envolvem a troca de informações, bens ou serviços entre usuários, empresas ou organizações. A relação entre melhores condições de conectividade e maior incidência de realização das atividades no ambiente virtual é explícita, ainda que em gradações diversas.

Para atividades de sociabilidade primária ou de entretenimento (tais como envio de mensagens instantâneas, uso de redes sociais e assistir a vídeos online), por exemplo, o nível de conectividade significativa teve menos efeito, diferentemente do que aconteceu no caso de atividades de maior complexidade e com maior potencial para emancipação das pessoas, como aquelas associadas à busca de informações sobre direitos e serviços, e atividades de natureza transacional, como operações financeiras e usos de serviços digitais de governo.

O estudo na íntegra está disponível no site: https://cetic.br/pt/publicacao/conectividade-significativa-propostas-para-medicao-e-o-retrato-da-populacao-no-brasil/.

Seminário

“Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil” faz parte da série Cadernos NIC.br de Estudos Setoriais. Além de Graziela Castello, coordenadora da pesquisa, participaram da publicação Sonia Jorge e Onica N. Mkwakwa (Global Digital Inclusion Partnership), União Internacional de Telecomunicações (UIT) e Fernando Rojas (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas – CEPAL).

O lançamento do documento aconteceu durante o Seminário Conectividade Significativa, realizado pela Câmara de Universalização e Inclusão Digital do CGI.br, nos dias 16 e 17 e abril, em Brasília. Para rever o evento, acesse o canal do NIC.br no YouTube.

 

Fonte: CGI.br

Para mais notícias sobre Políticas Públicas de Comunicação, acesse aqui.

 

Perda já “contratada” pela crise do clima chega a 19% da renda global, diz estudo

Compartilhe

Mesmo que, a partir de hoje, os países parem as emissões de gases de efeito estufa, a economia mundial chegará ao meio deste século amargando perdas anuais de 19% (ou US$ 38 trilhões, quase 20 vezes o PIB do Brasil), na comparação com um cenário sem efeitos das mudanças climáticas. O Brasil está entre os países mais afetados, com perdas que superarão os 25% nas regiões Norte e Centro-Oeste.

Os dados são de um estudo publicado nesta quarta-feira (17) na revista Nature, que calculou as perdas econômicas em renda per capita considerando aquilo que já está “contratado” pelas emissões ocorridas até aqui.  “Fortes reduções de renda estão projetadas para a maioria das regiões, incluindo América do Norte e Europa, com o Sul da Ásia e a África sendo os mais afetados. Isso é causado pelo impacto das mudanças climáticas em diversos aspectos relevantes para o crescimento econômico, como rendimentos agrícolas, produtividade do trabalho ou infraestrutura”, afirmou Maximilian Kotz, do PIK (Instituto de Pesquisa de Impactos Climáticos de Potsdam), na Alemanha, autor principal do estudo.

A pesquisa projetou as consequências regionais do aumento da temperatura e mudanças nos regimes de chuvas. Os cientistas analisaram  dados de mais de 1.600 regiões do mundo nos últimos quarenta anos e aplicaram uma metodologia que permite a identificação da persistência dos danos econômicos, para além das perdas imediatas relativas a eventos extremos específicos.

Os resultados indicam, ainda, que o montante perdido é seis vezes maior do que os gastos necessários ao longo desses 26 anos para conter o aquecimento do planeta em 2ºC em relação aos níveis pré-industriais. O comprometimento da renda agravará desigualdades regionais e tende a se intensificar depois de 2050 caso não haja corte significativo e acelerado nas emissões.

“Esses danos de curto prazo são resultado de nossas emissões passadas. Precisaremos de mais esforços de adaptação se quisermos evitar pelo menos alguns deles. E precisamos reduzir drasticamente e imediatamente nossas emissões. Caso contrário, as perdas econômicas serão ainda maiores na segunda metade do século, chegando a até 60% em média global até 2100. Isso mostra claramente que proteger nosso clima é muito mais barato do que não fazê-lo. E isso sem mencionar impactos não econômicos, como perda de vida ou biodiversidade”, afirmou Leonie Wenz, do Institute on Global Commons and Climate Change de Berlim, Alemanha, também autora do estudo.

Apesar de mostrar que a mudança do clima impactará, até 2050, também as grandes economias – os autores citam o seu próprio país, a Alemanha, mas também a França e os Estados Unidos como exemplo –, o estudo destaca que serão os países mais pobres, que menos contribuíram com o aquecimento global, os mais afetados. Os impactos econômicos serão um vetor de aprofundamento de desigualdades regionais, degradando a renda principalmente nos países tropicais.

A figura acima ilustra as disparidades. O Brasil, sobretudo nas regiões Norte e Centro-Oeste, concentra perdas expressivas, acima dos 25%. Em parte do Nordeste (compreendendo os estados do Ceará, Piauí e Maranhão) e no Sudeste (exceto Rio de Janeiro), as perdas projetadas são de 20 a 25%. Na região Sul, no Rio de Janeiro e demais estados do Nordeste (Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte) os danos ficarão na faixa dos 10% aos 20%.

Na América do Norte e Europa as reduções de renda são projetadas em aproximadamente 11%. Já no Sul da Ásia e na África, a queda será de 22%, apontam os dados. Apenas regiões em latitudes muito altas serão pontualmente beneficiadas.

“Os países menos responsáveis pelas mudanças climáticas sofrerão perdas de renda 60% maiores do que os países de renda mais alta e 40% maiores do que os países mais emissores”, comparou Anders Levermann, também do PIK e co-autor do estudo. “Cabe a nós decidir: uma mudança estrutural em direção a um sistema de energia renovável é necessária para nossa segurança e nos economizará dinheiro. Permanecer no caminho em que estamos atualmente levará a consequências catastróficas. A temperatura do planeta só pode ser estabilizada se pararmos de queimar petróleo, gás e carvão”, defende.

 

Fonte: Observatório do Clima

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Desigualdade ambiental em São Paulo: direito ao verde não é para todos

Compartilhe

Inúmeras casas de tijolo aparente despontam no horizonte do ribeirão dos Meninos, manancial que traça a divisa dos municípios de São Paulo e São Caetano do Sul. De um lado, os comércios, universidades e parques da cidade com o melhor IDH do Brasil, na região do ABC; do outro, as casas populares da comunidade de Heliópolis, a maior favela da capital paulista.

Nela, um sem fim de construções irregulares encobrem uma área com cerca de 1 milhão de metros quadrados no Sacomã, distrito com índice de cobertura vegetal bem abaixo da média do município de São Paulo: 17,7% da área total, como mostra o Mapa da Desigualdade, levantamento anual feito pela Rede Nossa São Paulo, iniciativa do Instituto Cidades Sustentáveis. O bairro do Morumbi, por exemplo, tem quase 45% de cobertura vegetal.

Heliópolis é um exemplo extremo que mostra como, desde o início da década de 1970, milhares de famílias foram privadas do direito ao verde enquanto se estabeleciam em regiões marcadas por problemas urbanos.

Hoje, estima-se que cerca de 200 mil pessoas vivam em Heliópolis, um desafio social e urbanístico para os governos e para a própria população. Pouca infraestrutura, falta de segurança e acesso a serviços são algumas das queixas amplamente noticiadas na imprensa sobre a comunidade. Mas, para entender como Heliópolis se tornou um dos gargalos da política de habitação urbana, é preciso fazer uma breve retrospectiva no tempo.

Em meados da década de 1970, enquanto zonas centrais eram planejadas por companhias como a City – que trouxe o conceito de bairros-jardim para a metrópole -, as periferias se solidificaram sob uma “arquitetura do possível”, em que a paisagem é alterada desordenadamente, sem obedecer a critérios habitacionais, urbanísticos e ambientais.

O desarranjo que se vê em Heliópolis é consequência de um processo de urbanização que privilegia a expansão horizontal da cidade, como explica Raquel Rolnik, professora da USP (Universidade de São Paulo) e autora do livro São Paulo: O Planejamento da Desigualdade: “A expansão horizontal foi se implantando em terrenos cada vez mais impróprios do ponto de vista geomorfológico, quando a urbanização ltrapassou as áreas da bacia sedimentar (onde os terrenos têm baixo potencial de erosão), para atingir os solos do complexo cristalino, de maior declividade e altamente vulneráveis à erosão”, escreve a professora.A falta de cobertura vegetal em Heliópolis e a falta de solo propício à absorção de chuvas — que, por consequência, provocam o aumento de enchentes — são problemas que cercam questões como o direito à moradia e a qualidade de vida. Em imagens de satélite, pode-se ver como a área é cinzenta. Há poucos respiros verdes em meio a tantas casas, e em um deles está a Missão Ambiental Helipa, que arborizou boa parte do terreno ao redor de um conjunto habitacional assinado por Ruy Ohtake no meio da comunidade.

“O direito ao verde também é direito à biodiversidade”

A história da Missão Ambiental, que cuida e incentiva a ação popular na área verde dentro de Heliópolis, partiu do biólogo Casé Oliveira em 1991. “O objetivo era reflorestar uma área para a criação de um refúgio, uma comunidade de vida na terra”, disse Oliveira à Mongabay.

Na época da implementação do projeto, às vésperas da Eco 92, conferência do clima que levou autoridades e ambientalistas importantes para o Rio de Janeiro, Oliveira e sua companheira Nina fundaram a ONG que hoje empreende uma agrofloresta dentro da comunidade. Depois de três décadas, a Missão Ambiental se tornou uma referência em matéria de projetos sociais na cidade e inaugurou sedes em outros bairros, como o Ipiranga.

Membro da Missão Ambiental e conselheiro do Cades (Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável) Ipiranga, o arquiteto e urbanista Thiago Santos pondera que o projeto público de arborização municipal está aquém do ideal e sofre com pressões cada vez maiores. Ele se refere à recente modificação no Plano Diretor que rege a cidade de São Paulo e ao assédio imobiliário tocado por grandes incorporadoras.Continua após a publicidade

“O Ipiranga é um bairro onde se pode ver inúmeros contrastes dentro de uma única região na cidade”, conta Santos. Em uma caminhada pelo distrito, é possível ver como a paisagem, antes predominantemente residencial, com casas e construções baixas, vem se transformando em um canteiro de obras.

A subprefeitura da região do Ipiranga é dividida em três áreas: Ipiranga, Sacomã e Cursino. Santos explica como a paisagem urbana se fragmenta naquela área. “O Alto do Ipiranga [perto do Museu Paulista da USP] é bem arborizado. Parques, praças e um corredor verde cortam a Avenida Nazaré [a maior do distrito], mas, quando andamos rumo ao Sacomã e Cursino [áreas periféricas], isso muda.”

Menos árvores, calçadas estreitas e pavimentos irregulares são fatores que interferem no plantio e na manutenção de árvores em vias públicas, pontua o arquiteto, que traz o exemplo de comunidades como Heliópolis.

“O direito ao verde também é direito à biodiversidade. Em projetos que tocamos na Missão Ambiental, como o do Corredor Verde, é feito o plantio de árvores pelo bairro para incentivar também a polinização, além de termos já observado novas espécies de aves”, conta Santos.

Com o objetivo de minimizar ilhas de calor e tornar a paisagem menos hostil, a implementação do Corredor Verde – projeto piloto que começou em meados de 2023 no bairro do Butantã – vem progredindo por conta de uma parceria de lideranças populares locais com as subprefeituras. O objetivo, além de plantar em vias públicas, é interligar grandes áreas verdes nos bairros para formar um corredor onde a circulação da fauna é livre. Butantã e Ipiranga são pioneiros nas iniciativas.

Histórias como a do Corredor Verde são exceção em São Paulo, que, no imaginário popular, ganhou o epíteto de “Selva de Pedra”. Para o Secretário do Verde e do Meio Ambiente da cidade de São Paulo, o apelido pode soar como um exagero. Já que são cerca de 650 mil árvores espalhadas pelas vias públicas, segundo o último levantamento realizado pela cidade em 2017 (a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente diz que os dados serão atualizados até o fim de 2024).

São Paulo tem 11,7% de suas ruas arborizadas – dado que contrasta com outras capitais, como Curitiba, onde o índice de arborização viária é de 76,1%, e Porto Alegre, com um número que chega a 82,7% de árvores plantadas nas ruas.

Este número não conta plantios em parques e é um dado importante para se projetar quais bairros, por exemplo, estão mais suscetíveis a ilhas de calor e aos poluentes atmosféricos.

Segundo o Mapa da Desigualdade de São Paulo, os distritos com melhores índices de arborização estão, justamente, no extremo norte e no extremo sul – onde ficam as serras da Cantareira (distritos de Tremembé e Perus) e do Mar (distritos de Marsilac e Parelheiros), ambas protegidas por parques estaduais.

Segundo Igor Pantoja, da Rede Nossa São Paulo, que elaborou o Mapa da Desigualdade, em Marsilac, assim como na região da Cantareira, as contradições saltam dos números para a realidade: “Nas bordas desses lugares, muito verde; mas, dentro dos bairros, poucas árvores e falta de estrutura”.

Ativismo

Para tentar compreender essa dissonância, a Mongabay conversou com lideranças envolvidas com a pauta ambiental em São Paulo para saber como o tema é tratado pelas subprefeituras e pela Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente.

Para Rosângela Vieira, membro do Cades da região do Campo Limpo, a questão de planejamento é o primeiro passo para se falar em democratização do verde na cidade: “em São Paulo, olha-se a questão do plantio de árvores de uma forma quantitativa, e não qualitativa”.

Vieira dá exemplos de comunidades na Zona Sul da cidade, onde existem bolsões verdes que contrastam com a falta de infraestrutura ambiental dentro dos bairros, ou seja, sem árvores, praças e bosques. Ela cita os distritos de Marsilac e Parelheiros, cujos mananciais resultam em bons indicadores de arborização, “mas, se você pegar por distrito, de forma regionalizada, existem regiões completamente cinza”.

Com menos verde nos bairros, as queixas dos vizinhos se multiplicam. “A gente vê uma série de consequências, como o aumento das ilhas de calor e da poluição”, pontua Vieira. Em outros pontos da cidade, como a comunidade de Paraisópolis, a situação é ainda mais alarmante.Continua após a publicidade

Para o ativista e músico Valdemir José Trindade, o Guga Brown, existe em Paraisópolis, favela onde nasceu e mora até hoje, um “medo de se plantar árvore”. Ele explica: “Quando alguém planta uma árvore no seu quintal, isso implica custos de manutenção. Com o passar do tempo, é preciso fazer a poda, mas quase nunca a prefeitura atende aos pedidos. Geralmente são as pessoas que têm que arcar com os custos, e isso afasta [os moradores do plantio].

“Em Paraisópolis, são poucas árvores. Praças, canteiros e parques têm uma ou outra; na maioria das vezes, não existe espaço nem pra você sair de casa e pegar uma sombra. As pessoas ficam deprimidas. Quando saem, ficam expostas ao sol, ao calor. Está cada vez mais quente e aqui a gente tem cada vez menos árvore”, conta Brown.

Segundo Evangelina Araújo, médica patologista, especialista em sustentabilidade, diretora do Instituto Ar e embaixadora da iniciativa Médicos pelo Ar Limpo, “áreas verdes têm um papel fundamental para a saúde dos moradores de uma cidade”. “Pela OMS [Organização Mundial da Saúde], as cidades devem ter 12 metros quadrados por habitante de áreas verdes. Além do conforto e a sensação de bem-estar com suas sombras e o equilíbrio que trazem ao microclima local, elas absorvem poluentes atmosféricos.”

“Nós ultrapassamos a marca recomendada pela OMS: São Paulo tem 16 m² [de áreas verdes] por cidadão”, diz Rodrigo Ravena, secretário do Verde e Meio Ambiente do município, frisando que regiões menos arborizadas são contempladas com mais exemplares. “A secretaria tem ampliado as ações para arborização da cidade, mas a gente tem que evoluir isso na medida em que a cabeça das pessoas evolui, e isso depende, no meio do caminho, da educação ambiental de todo mundo”.

Ravena lembra que, em 2023, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente mapeou a vegetação significativa da cidade de São Paulo, o que não ocorria desde 1988. “O levantamento mostrou um acréscimo de 32% para 44% de vegetação significativa protegida (ou seja, de 490 para 678 km²)”, escreveu o órgão à Mongabay por meio de sua assessoria de comunicação.Continua após a publicidade

Lideranças discordam. Fábio Sanchez, um dos articuladores do Fórum Verde, organização civil sem fins lucrativos que acompanha a pauta ambiental da cidade de São Paulo, afirma que “falta para a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente investir em uma inteligência de arborização”.

Sanchez, que vê com maus olhos os desdobramentos da recente revisão do Plano Diretor da cidade, aponta que hoje “há uma maneira de cumprir metas onde não há tanta demanda assim”. Segundo o ativista, a Secretaria hoje investe, sobretudo, no plantio em parques, onde já há vegetação abundante, e esquece de áreas carentes de arborização. Na prática, bolsões verdes contrastando com áreas peladas.

O urbanista Thiago Santos vai na mesma linha de Sanchez: “A burocracia no trato com a Secretaria do Verde e com as subprefeituras enterra, muitas vezes, a boa vontade de quem quer plantar”. Guga Brown também traz histórias parecidas de cidadãos de Paraisópolis que precisam desembolsar recursos próprios para ter uma árvore em frente de casa.

Para Santos, falta especificar quantas árvores foram plantadas em determinados lugares – ruas, parques, praças, com especificações adequadas – para que planos mais efetivos e sustentáveis possam ser colocados em ação e assim evitar que os bairros percam o verde. Novamente, discute-se a questão da “inteligência de arborização”, citada por conselheiros do Conselho Municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de diferentes regiões.

Nesta complexa equação envolvendo arborização, desigualdade e planejamento, quando se aponta para uma média, a cidade pode até cumprir metas internacionais, como as orientadas pela OMS. Mas no miúdo, no cotidiano, vê-se uma metrópole que agoniza, com obras perfurando bairros, cursos de água soterrados e árvores ao chão. As consequências são pagas pela grande maioria da população, que habita longe do verde e sofre com isso.

 

Fonte: Geledés

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Visão Mundial lança nova edição de cartilha bilíngue sobre direitos e serviços para refugiados e migrantes

Compartilhe

A Visão Mundial, por meio do projeto Ven, Tú Puedes!, lança a segunda edição da cartilha bilíngue “Guia Prático sobre Mercado de Trabalho e Proteção para Migrantes e Refugiados no Brasil”. Esta versão revisada amplia significativamente o conteúdo, incluindo orientações sobre acesso a serviços e direitos básicos no país.

Daiane Lacerda, assessora de proteção da Visão Mundial, enfatiza a importância deste material, que foi desenvolvido em português e espanhol para atender tanto ao público brasileiro quanto aos refugiados e migrantes de língua espanhola, com destaque para os venezuelanos, que representam 95% da nacionalidade atendida pelo projeto. “A cartilha visa preencher lacunas de informação e proporcionar orientação essencial sobre direitos trabalhistas, combate à exploração e agora, também, acesso a serviços básicos como saúde, educação e benefícios sociais”.

A nova edição é um guia prático indispensável para aqueles que buscam se integrar e se estabelecer de maneira efetiva e regular no Brasil. As informações passam por temas de documentação para trabalho, funcionamento do mercado de trabalho brasileiro, direitos trabalhistas, como se integrar diante dos desafios enfrentados pelas pessoas refugiadas e migrantes.

Também é destacado no guia como pedir ajuda em casos de necessidade de denúncia, e é divulgado o canal exclusivo para atender aos seus participantes que precisam de orientação de proteção, o canal Protegerte. Trata-se de um número exclusivo para situações de denúncias do projeto Ven, Tú Puedes!

Para acessar o conteúdo digital da cartilha, em suas versões em português e espanhol, clique nos links abaixo:

Versão em Português

Versão em Espanhol

Sobre o projeto:
O projeto Ven, Tú Puedes! é uma das respostas da ONG Visão Mundial ao contexto migratório da Venezuela. Em operação nos estados de Roraima, Amazonas e São Paulo, tem como objetivo principal prover integração segura e soluções duradouras para migrantes e refugiados venezuelanos no Brasil, com ações em três eixos: Empregabilidade, Empreendedorismo e Proteção.

Financiado pelo Escritório de Populações, Refugiados e Migrantes (PRM), do governo dos Estados Unidos, desde 2019, o projeto tem se consolidado como uma iniciativa essencial para a geração de oportunidade, geração de meios de vida, dignidade e inclusão socioeconômica de populações vulneráveis.

Entre os serviços oferecidos, destacam-se os cursos de língua portuguesa, ações de capacitação profissional, com apoio na emissão da carteira de trabalho digital, busca de vagas formais junto ao setor privado, banco de talentos, acompanhamento de entrevistas, sensibilização para inclusão no ambiente de trabalho, curso de empreendedorismo e apoio a pequenos negócios de migrantes e refugiados, além de apoio a interiorização pela modalidade de vaga de emprego sinalizada.

Sobre a Visão Mundial:
A Visão Mundial trabalha em defesa dos direitos das crianças e adolescentes, além de atuar pela proteção de populações vulneráveis em todo o mundo. Fundada em 1950, teve como intuito inicial levar a justiça e assistência às crianças vítimas da pobreza, em Oregon, nos Estados Unidos. Presente em mais de 100 países; Trabalhando para auxiliar a todas as pessoas sem distinção de credo, etnia ou gênero.

 

Fonte: Visão Mundial

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Lula, não queremos fazenda, queremos a demarcação das nossas terras

Compartilhe

O presidente Lula sugeriu ao governador do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB), que compre terras para salvar os indígenas da etnia guarani que vivem “na beira da estrada” em Dourados (MS). “Eu quero lhe dizer que se você encontrar as terras para que a gente recupere a dignidade desse povo, o governo federal será parceiro na compra e no cuidado para que eles voltem a viver dignamente. O que eles não podem é ficar na beira da estrada mendigando”, afirmou.

A proposta foi feita nesta sexta-feira, 12/04, durante um ato de comemoração pela habilitação (permissão para funcionar) de frigoríficos da JBS, em Campo Grande (MS). A carne será exportada para a China. A produção de carne no Brasil é um dos expoentes da agropecuária, ou do agronegócio, junto a soja, a cana-de-açúcar, o café e o milho. Também é uma das maiores ameaças às florestas. Em 2021, a produção de gado impulsionou sozinha 75% do desmatamento e0m terras públicas (Dados do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Ipam).

Com a afirmação, Lula endossa a posição do governador de direita, que gravou um vídeo para redes sociais reiterando a ideia de que assim, solucionaria o conflito fundiário que se estende há anos no MS. “Esse é um caminho que a gente está propondo há muito tempo”, disse Riedel.

A proposta de “comprar uma terra” para os indígenas é tão contraditória quanto o evento escolhido para fazer tal anúncio.

A compra de terras para assentar. povos indígenas afronta o direito originário de ocupação tradicional assegurado pela Constituição Federal de 1988. A Carta Magna (Art. 231) não manda comprar terras e sim demarcar e proteger as terras tradicionalmente ocupadas, assegurando sua posse permanente e o usufruto exclusivo para os povos. Terras essas, que são inalienáveis e indisponíveis, sendo os direitos originários sobre elas imprescritíveis. O que tornam nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras indígenas.

Lula, erra ao assumir o discurso presente na Lei do Marco Temporal, uma Lei inconstitucional, que foi imposta no final do ano passado pelo Congresso ruralista, e certamente, será mais uma vez derrubada no STF.

O mais grave é que o governo Lula está manchando a sua trajetória histórica. Desde a campanha do seu primeiro mandato em 2002, o presidente se comprometeu a demarcar o passivo das terras indígenas, mas foi um dos governos que menos demarcou. E agora, como outros velhos e conservadores governos, em nome do progresso e do desenvolvimento econômico do país, rifa a base de existência dos povos indígenas, tornando-se refém do mercado, do Centrão, do Agronegócio, dos Evangélicos e dos militares.

Ao admitir a “compra de fazendas”, Lula está renunciando a seu programa de viés social e popular, faltando com sua palavra e aderindo a injustiça histórica que até hoje coloca os povos indígenas à beira da extinção física e sociocultural, pois sem terra e território, perdemos a razão mais sagrada de nosso existir e bem viver.

Em todo o Brasil, até o momento, foram criados nove assentamentos de reforma agrária, no terceiro governo Lula e apenas seis Terras Indígenas foram homologadas. O investimento do governo no agronegócio foi de R$ 363 bilhões em 2023. Já a agricultura familiar recebeu R$ 71 bilhões, um total cinco vezes menor. Já o orçamento do Ministério dos Povos Indígenas foi de R$ 813 milhões e do INCRA, órgão responsável pela Reforma Agrária, foi inferior a R$ 500 milhões.

Os números mostram as prioridades do governo petista, um governo de coalisão de forças contraditórias. Alianças que foram necessárias para eleger e manter Lula no páreo, desde seu primeiro mandato e, agora, frente aos avanços fascistas do Bolsonarismo e ao Congresso mais conservador da história da legislatura brasileira

Os povos do campo, das florestas e das águas, como tudo indica, estão longe de ser considerados pilares estruturantes para as políticas dos próximos anos. No entanto, conhecemos de perto essa lição. O projeto popular para o Brasil se tornará realidade à medida de nossa força para organizar, formar consciências, lutar e comunicar. São as lutas que garantem as nossas conquistas. É a luta que garante a democracia, o Estado Democrático de Direito e respeito aos direitos fundamentais, num país em que reina a autocracia de uma burguesia covarde e submissa ao capital internacional, como já dizia Florestan Fernandes.

A demarcação das Terras Indígenas Guarani, Kaiowá, Nhandeva e demais será conquistada pela nossa organização, pela mobilização do movimento indígena, através da luta. Nossos corpos-territórios, a vida das nossas atuais e futuras regionais, não estão em mesa de negociação.

Lula, se tem recursos, demarca e desintrusa as terras indígenas, acaba com as organizações criminosas que intimidam os nossos povos e comunidades, perseguem e assassinam as nossas lideranças. Destine fazendas para a reforma agrária e demarque nossas terras, secularmente invadidas e esbulhadas pelos invasores que aqui chegaram, há 524 anos, e seus atuais descendentes.

O nosso marco é ancestral. Sempre estivemos aqui.

Demarcação Já!

Leia a nota da nossa organização de base, Aty Guasu, sobre o caso.

 

Fonte: Apib

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Congresso Nacional aprova Política Nacional de Qualidade do Ar

Compartilhe

O Projeto de Lei 3.027/2022, que institui a Política Nacional de Qualidade do Ar (PNQA), foi aprovado em março pelo Congresso Nacional e aguarda apenas a sanção presidencial para virar lei nacional. A proposta institui o “Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitorAr)” e estabelece como instrumentos para a qualidade do ar a definição de limites máximos de emissão atmosférica e seu inventário; a adoção de padrões de qualidade do ar e seu monitoramento; a instituição de incentivos fiscais; e a criação de planos setoriais de gestão da qualidade do ar e de controle da poluição por fontes de emissão, entre outros temas. São medidas que visam ampliar a preservação ambiental e assegurar a saúde pública.

Mais do que uma notícia relevante, trata-se de uma vitória, e ela pode ser atribuída a toda a sociedade civil. Alguns atores específicos, no entanto, merecem destaque – afinal, a aprovação do PL é o resultado de um trabalho contínuo cujo início data de oito anos atrás, e que incluiu participações em audiências públicas em ambas as casas legislativas, consolidação de conhecimento e desenvolvimento de estudos técnicos, como por exemplo a Plataforma de Qualidade do Ar e o estudo “Dimensionamento da Rede Básica de Monitoramento da Qualidade do Ar no Brasil – Cenários Iniciais”, do Instituto de Energia e Meio Ambiente.

Voltemos ao início para traçar uma linha do tempo dos principais acontecimentos. 

Entre 2016 e 2017, o Instituto Clima e Sociedade definiu, entre suas estratégias, trabalhar a agenda do clima por meio da descarbonização do transporte público, o que culminou com a criação do portfólio de Mobilidade Urbana, que mais tarde mudaria de nome para Transporte. Para aproximar a população da discussão sobre descarbonização do transporte público, assunto técnico e complexo, a decisão foi atuar na temática da qualidade do ar e promover o debate da eletrificação da frota de ônibus no Brasil.

São Paulo foi o ponto de partida. O iCS identificou atores e stakeholders que transitavam no assunto, mesmo dissociados, muitas vezes, da agenda climáticas, e os esforços tiveram início. Na esteira desses encontros, a parceria com o então Instituto Saúde e Sustentabilidade (ISS), hoje Instituto Ar, começou a se fortalecer.

Em 2017, quando o iCS e seus donatários, como a Purpose, lançaram campanhas de comunicação sobre a qualidade do ar em São Paulo, enquanto a sociedade civil (em especial a ISS, o ICCT, o Instituto Alana e o IEMA) realizava incidência junto a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), com o intuito de aprovar a Lei Estadual dos Ônibus Limpos (16.802/18), que previa a substituição da frota do município de São Paulo – em 2018, o prefeito João Dória sancionou a regulamentação, que legisla sobre a eletrificação dos ônibus na capital.

A vitória nos levou a voos maiores, com o início da articulação nacional em prol da agenda de qualidade do ar. Nessa época, o iCS solicitou o apoio direto do ISS para a redação/elaboração de um Projeto de Lei que instituísse a Política Nacional da Qualidade do Ar – ele se tornaria o PL 10521/18 na Câmara dos Deputados. Enquanto isso, a atuação coletiva em São Paulo levou à formação da Rede Mobilidade e Clima.

Participação em audiências públicas

Já em 2019, o IEMA (Instituto de Energia e Meio Ambiente), o ISS e o ICCT (International Council on Clean Transportation) participaram de audiência pública sobre qualidade do ar na Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, enquanto o Ministério Público Federal ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra resolução do Conama sobre qualidade do ar (ADI 6148). Este movimento teve apoio direto do ISS e do Instituto Alana como amicus curiae (instituições que participam de processos como amigos da corte, ou seja, aqueles que embasam/corroboram argumentos com dados e estudos), uma vez que a resolução indicou política de parâmetros de qualidade do ar, mas não indicou nem previsão de tempo e nem os instrumentos para alcançá-los.

Embora o STF, em 2022, não tenha aceitado a sua inconstitucionalidade, determinou ao Conama a definição de metas. Em caso de não cumprimento, o Brasil passaria a assumir, automaticamente, as metas da Organização Mundial de Saúde. Este tornou-se um importante pano de fundo para a Política Nacional de Qualidade do Ar.

Durante a elaboração do texto inicial do Projeto de Lei, o ISS, que liderou o processo (com envolvimentos do Instituto Alana, ICCT, entre outros), a partir das articulações e doações do iCS, também conversou com a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), para  chegar a um consenso de medidas e oportunidades para a PNQA.

O advento da pandemia da Covid-19, em 2020, ajudou no surgimento da Coalizão RespirAR, criada a partir desta rede de atores da sociedade civil, organizada com apoio do iCS. Ela lançou um manifesto em defesa da retomada da agenda de qualidade do ar no debate público. As doenças respiratórias estavam, mais do que nunca, em evidência, assim como os efeitos da poluição atmosférica na saúde das pessoas. Fatos como esses marcaram a primeira audiência pública na Câmara dos Deputados para debater o PL 10521/18.

A luz vermelha de perigo para os debates qualidade do ar reacendeu com força em 2021, quando a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (ANFAVEA) tentou postergar os prazos da nova fase do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) para a adoção de tecnologias mais limpas, prevista para começar em 2022. O Ministério Público Federal negou o pedido.

Nova audiência pública sobre qualidade do ar foi agendada para a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, quando a Coalizão RespirAR foi representada, com sustentação oral, por Hélio Wicher Neto, do ISS. Ainda naquele ano, o PL foi aprovado na primeira Comissão na Câmara dos Deputados.

Além do julgamento do STF em relação à ADI 6148, o ano de 2022 teve um momento-chave: a Câmara dos Deputados aprovou o PL 10521/18, sem a proposição da CNA (Confederação Nacional da Agricultura) de restringir a meio urbano.

O caminho estava, enfim, aberto para que, em 2023, o PL do PNQA avançasse no Senado. Ao mesmo tempo, o CONAMA atualizou os padrões de qualidade do ar, seguindo a determinação do STF no ano anterior.

Depois de uma longa estrada, o Senado aprovou a Política Nacional de Qualidade do Ar no mês passado.

O que teve início com o transporte público virou algo muito maior, que envolve as queimadas da Amazônia e muitas outras fontes de poluição atmosférica. O trabalho está só começando.

Contexto

  • Baixa implementação de políticas públicas para qualidade do ar:
    • Apenas 13 dos 26 estados do país têm alguma estação automática de monitoramento do ar.
    • Mais de 80% das 245 unidades do equipamento disponíveis no país estão concentradas no Sudeste.
    • Menos da metade dos 49 municípios brasileiros com mais de 500 mil habitantes possuem estações de inspeção de poluentes no ar.
  • Ausência de investimento público no monitoramento da qualidade e outros instrumentos de controle e gestão
  • Vácuo normativo.

O que a Política Nacional de Qualidade do Ar traz de novo?

  • Criação do Sistema Nacional de Gestão da Qualidade do Ar (MonitoAr), que será responsável por monitorar padrões de medição estabelecidos pelo CONAMA e por divulgar dados nacionais em tempo real, baseando-se em dados estaduais.
  • Após sanção da proposta, levantamento das emissões de poluentes deve ser realizado em até 3 anos pelos entes subnacionais para estabelecer parâmetros regionais de poluição.
  • Governo federal deverá elaborar levantamento nacional consolidado das emissões em até 1 ano após os levantamentos regionais.
  • Prevê benefícios fiscais e financiamento para capacitação, pesquisa, desenvolvimento tecnológico e sistemas de gestão que reduzam emissões de poluentes.
  • Fomento à implementação de programas como Pronar, Proconve, Promot, programas de sucateamento, reciclagem e renovação de frotas, e inspeção e manutenção de veículos.
  • Emenda permite aos estados e municípios criarem controles de emissão para fontes móveis veiculares, incluindo restrições de circulação baseadas em níveis de emissão.

 

Fonte: Instituto Clima e Sociedade

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Reforma tributária: alimentação saudável em risco

Compartilhe

Organizações da sociedade civil, entre elas o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), lançaram nesta sexta (12) uma nota pública em defesa do direito humano à alimentação adequada e saudável. No posicionamento, as organizações repudiam as ações de interferência da indústria de produtos alimentícios ultraprocessados no contexto de discussão das leis complementares da Reforma Tributária.

Representantes do setor produtivo vêm se articulando e atuando para incluir ultraprocessados e bebidas alcóolicas na cesta básica, e para se eximir da nova tributação sobre produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente via Imposto Seletivo.

O objetivo é claro: atender a interesses comerciais e privados em detrimento da saúde coletiva, da segurança alimentar e nutricional e da proteção ao meio ambiente.

“A reforma tributária é uma oportunidade histórica para o país, que pode não apenas tornar seu sistema de impostos mais simples e eficiente do ponto de vista econômico, mas também promover justiça social, saúde e alimentação adequada e saudável para sua população”, afirma a nota.

> Clique aqui para acessar a íntegra <<

 

Fonte: Inesc

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Instituto Odara lança dossiê sobre a letalidade policial que atinge crianças negras na Bahia

Compartilhe

O Odara – Instituto da Mulher Negra torna público o documento “Quem vai contar os corpos?”: Dossiê sobre as mortes de crianças negras como consequência da atuação da Polícia Militar da Bahia. Produzido a partir da atuação do projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar, o dossiê apresenta histórias reais e dados sobre mortes de crianças e adolescentes em consequência de operações policiais na Bahia durante os últimos 13 anos.

“O objetivo é demonstrar o quanto a violência policial tem crescido e atingido de maneira letal as nossas crianças. É um documento que faz cair por terra o argumento mobilizado pelas polícias para justificar a morte dos jovens nos nossos territórios, uma vez que os agentes de segurança pública associam a imagem das vítimas ao envolvimento com o comércio ilegal de drogas”, explica Lorena Pacheco, advogada e assessora jurídica do projeto.

O dossiê apresenta as história de Mirella do Carmo BarretoMicael Silva MenezesGeovanna Nogueira e Joel Conceição Castro, traz dados sobre violência e letalidade policial na Bahia e no Brasil, aborda os impactos das mortes para as famílias das vítimas e apresenta uma série de recomendações para promover a reparação e Bem Viver para a população negra.

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), 83% das vítimas de letalidade policial no Brasil em 2022 eram negras e 76% tinham entre 12 e 29 anos. “O genocídio antinegro atinge especificamente a juventude porque é nessas pessoas que está concentrado o vigor físico, o vigor de trabalho, reprodutivo. Quando atinge a juventude, se coloca em risco a continuidade do nosso povo como um todo”, afirma Daiane Ribeiro, também advogada e assessora jurídica do projeto.

O dossiê “Quem vai contar os corpos?” já está disponível para leitura e download no site do Odara – Instituto da Mulher Negra, com versões em português, espanhol e inglês. Acesse: https://institutoodara.org.br/public/quem-vai-contar-os-corpos-dossie-sobre-as-mortes-de-criancas-negras-como-consequencia-da-atuacao-da-policia-militar-da-bahia/

A expressão “Quem vai contar os corpos?”, assim como outros versos que aparecem ao longo do documento, fazem referência à música “Cabô”, da cantora e compositora Ludeji Luna.

Sobre o projeto

O projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar foi criado em 2014 e atua no apoio, articulação, fortalecimento e diálogo com as mães de jovens assassinados em decorrência da violência; sensibilização com adolescentes e jovens sobre violência policial, direitos humanos e construção de uma cultura de paz, através de oficinas ministradas nas escolas da rede pública de Salvador; e assessoria jurídica voltada às mulheres negras mães e familiares dos jovens assassinados e à atuação nos processos criminais decorrentes destes homicídios.

 

Fonte: Portal Geledés

Para saber mais sobre o direitos das crianças, conheça a newsletter Infância na Mídia.

Contribuintes podem destinar parte do IR para projetos voltados a crianças e adolescentes

Compartilhe

O Conselho Nacional da Justiça (CNJ) lançou, durante a 1ª Sessão Extraordinária de 2024 do CNJ, a quarta edição da campanha “Se renda à infância”. A iniciativa, em parceria com a Receita Federal, possibilita destinar no máximo 3% do imposto devido, diretamente na Declaração para os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente (Nacional, Distrital, Estaduais e Municipais). Os valores contribuem para financiar projetos de promoção dos direitos das crianças e dos adolescentes.

O presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, apresentou o projeto e conclamou os brasileiros a apoiarem a campanha. “Os recursos serão revertidos em ações concretas, em prol da proteção dos direitos da infância e dos adolescentes em variadas áreas, entre elas, a promoção da saúde, com a manutenção e a construção de hospitais, educação, capacitação de adolescentes e jovens para o mercado de trabalho, ou ainda no combate à violência e ao trabalho infantil”, explicou o ministro Barroso.

Em 2023, mais de 3 mil fundos de direitos destinados à infância e à adolescência receberam, segundo dados da Receita Federal, R$ 175 milhões. O valor foi 20% superior ao de 2022. Em 2024, a Receita Federal, o Conselho Nacional de Contabilidade (CFC), o Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege), o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) vão unir forças para alavancar as destinações. O desafio esse ano é aumentar a contribuição.

“Todo mundo saberá, na declaração de IR, a possibilidade de destinar parte do imposto a ser pago à doação a fundos específicos de amparo à infância. É uma opção que se dá ao contribuinte, ao invés do caixa único, escolher uma destinação que beneficie as crianças”, reforçou o presidente do CNJ, durante a sessão extraordinária.

Como destinar?

O período de Declaração de Imposto de Renda se inicia nesta sexta-feira (15/3/2024). Os contribuintes pessoas físicas podem destinar até 3% do imposto devido diretamente na Declaração para os Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente (Nacional, Distrital, Estaduais e Municipais). Para destinar, é necessário optar pela Declaração por Deduções Legais (Declaração Completa).

O programa disponibilizado pela Receita Federal calcula o valor limite individual automaticamente depois que a declaração é preenchida com as informações de rendimentos e despesas. A possibilidade de destinação e o percentual já são definidos por lei. “Importante que o contribuinte saiba que não há custo adicional para ele, uma vez que não é doação, é destinação. Ou seja, ao invés de destinar todo o Imposto para a União, ele opta por destinar parte para uma instituição que protege os direitos das crianças e dos adolescentes,” destaca Edinaldo César Santos Júnior, juiz auxiliar da Presidência do CNJ.

O benefício fiscal, ou seja, a redução do imposto de renda a pagar ou aumento do valor do imposto de renda a restituir, só ocorre após o pagamento do documento de arrecadação (Darf) gerado no programa, o qual deve ser realizado até o último dia da declaração (31 de maio de 2024).

Administração dos recursos

Os valores recebidos pelos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente são administrados pelos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, que são colegiados com a participação do Executivo e de membros da sociedade civil. Cabe a esses conselhos a destinação dos recursos para os projetos das instituições sociais.

A fiscalização, o controle e a prestação de contas para a sociedade dos recursos destinados à campanha “Se Renda à Infância” estão a cargo dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente, nos níveis nacional, estaduais, distritais ou municipais, dos Tribunais de Contas e do Ministério Público.

Iniciativa

O CNJ promove a campanha “Se Renda à Infância” desde 2021, visando incentivar a realização de projetos voltados a promoção de direitos e cidadania de crianças e adolescentes, especialmente aqueles em situação de risco e vulnerabilidade, por exemplo, em medida protetiva de acolhimento ou em cumprimento de medidas socioeducativas.

A campanha também foi endossada a partir de estudos e discussões realizados no âmbito do Pacto Nacional pela Primeira Infância. O pacto é um instrumento que estabelece cooperação técnica e operacional para o aprimoramento da infraestrutura necessária à proteção do interesse da criança e reúne atores envolvidos com o tema.

 

Fonte: CNJ

Para saber mais sobre o direitos das crianças, conheça a newsletter Infância na Mídia.

 

Após sete anos de luta, DNIT ouve os xinguanos e altera sua proposta de traçado para a BR 242

Compartilhe

Em julho de 2017, caciques e lideranças do Xingu enviaram pela primeira vez uma carta ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) reivindicando alteração no traçado da rodovia BR 242.

De lá pra cá, os povos do Xingu fizeram diversas manifestações reivindicando seu direito à Consulta Livre, Prévia e Informada antes que a obra fosse iniciada.

Sete anos depois, em fevereiro de 2024, a luta deu resultado: o DNIT oficializou o atendimento à reivindicação dos povos do Território Indígena do Xingu (TIX) e alterou sua proposta de traçado para a BR 242.

A proposta original do DNIT previa a abertura de mais de 40 quilômetros de estradas em áreas de floresta na região das nascentes do Rio Xingu, em trecho que ligaria o município de Gaúcha do Norte a Querência. Os xinguanos questionavam por que não projetar a BR 242 sobre estradas já existentes na região, passando pelo município de Canarana, sem precisar derrubar uma árvore sequer.

Em outra parte da BR 242, entre Gaúcha do Norte e o Distrito de Santiago do Norte, os povos do Xingu reivindicavam mais uma alteração no traçado: a proposta do DNIT impactava diretamente a paisagem cultural sagrada de Kamukuwaká, sítio arqueológico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Nesse caso, também seria necessário abrir um novo trecho de rodovia em área de floresta preservada, além de construir uma ponte sobre o Rio Batovi em cima da paisagem de Kamukuwaká. Os xinguanos pediam o mínimo: realizar um desvio no traçado proposto pelo DNIT aproveitando estrada e ponte já existentes na região, afastando a BR 242 em 12 quilômetros do patrimônio histórico tombado.

A paisagem sagrada de Kamukuwaká tem sofrido com invasões constantes de pescadores. Apesar de tombado pelo Iphan desde 2010, o local é completamente desprotegido. Em 2018, o principal painel de arte rupestre de Kamukuwaká foi depredado em ação criminosa. Inquéritos foram abertos pelo Ministério Público, mas ninguém foi responsabilizado e nenhuma ação reparatória foi proposta.

Kamukuwaká é um sítio arqueológico vivo. Os povos que vivem atualmente no TIX seguem frequentando o local, revivendo ritos e histórias da criação do mundo que lá se sucederam em tempos imemoriais.

Conheça esse patrimônio vivo do Xingu no vídeo da Associação Terra Indígena Xingu (Atix) e da Rede Xingu+, com apoio do Instituto Socioambiental (ISA). Assista!

Consulta e vitória

A proposta de traçado defendida pelos xinguanos ao longo desses anos foi acolhida pelo DNIT em manifestação oficial do órgão em fevereiro deste ano. No entanto, a obra ainda não está autorizada. Os estudos de impacto sobre a vida dos povos do TIX ainda nem começaram. Os xinguanos deram várias contribuições para a metodologia de pesquisa e participarão ativamente dos trabalhos práticos e teóricos da equipe responsável pelo trabalho. Mais uma conquista fruto de muita negociação com o governo.

Em 2019, os xinguanos foram a Brasília e convenceram o governo a assinar um acordo de Consulta Livre, Prévia e Informada. Além da BR 242, a Ferrovia de Integração do Centro Oeste (FICO) também é objeto do acordo. Nenhuma licença ambiental pode ser emitida para essas obras sem ouvir e negociar com os xinguanos primeiro.

Esse é um importante caso de aplicação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), acordo internacional do qual o Brasil é signatário que garante aos povos indígenas o direito de serem ouvidos sempre que o governo planeja ações que possam impactá-los.

Em julho de 2023, DNIT, Ibama, Funai, Iphan, os ministérios dos povos indígenas e dos transportes e a Infra SA estiveram no TIX pela primeira vez para tratar dessas obras e dialogaram com mais de 100 lideranças indígenas durante três dias na 9ª edição da Reunião de Governança Geral do Território Indígena do Xingu (GGTIX).

“Se eu entrar na igreja, destruir alguma coisa ali, ninguém vai deixar. Porque ali é um lugar sagrado. É a mesma coisa: Kamukuwaká e Sagihengu são lugares muito sagrados. Ali está a nossa história, ali é nossa raiz”, afirmou na ocasião o cacique Tapi Yawalapiti. Kowo Trumai reforçou: “Eu estou aqui falando em nome das nossas crianças, vamos seguir a estrada que já existe”. Depois deles, caciques e lideranças dos 16 povos do TIX argumentaram e provaram que o diálogo com os povos indígenas leva a decisões melhores, mais sensatas e benéficas para toda a sociedade brasileira.

Muito além do traçado da BR 242

Uma série de medidas estão sendo reivindicadas pelos povos xinguanos que não se limitam à alteração do traçado da BR 242. A possível construção da BR 242 e da FICO na região das nascentes do Rio Xingu vai aprofundar um cenário de intenso desmatamento, assoreamento dos rios, morte de nascentes, diminuição de peixes, desequilíbrios ecológicos e climáticos, aumento das lavouras com consequente aumento da contaminação por agrotóxicos, dentre uma série de outros problemas já sentidos na região que precisam ser estudados e revertidos.

A sustentabilidade da vida no Xingu está ameaçada. O Estado do Mato Grosso e os municípios da região promovem um modelo de desenvolvimento econômico que destrói as florestas, seca e contamina os rios. Enquanto que na Amazônia Legal Brasileira o desmatamento caiu 22% entre agosto de 2022 e julho de 2023 em relação ao mesmo período do ano anterior, no Mato Grosso, o desmatamento aumentou 8%, passando de 1,9 mil km² para 2,08 mil km² no período [PRODES 2023, INPE].

Ao mesmo tempo, o Mato Grosso está há mais de uma década tentando aprovar uma Lei de Zoneamento Socioeconômico e Ecológico sem sucesso. A lentidão demonstra que não é prioridade para a amplamente majoritária bancada ruralista na Assembleia Legislativa do Mato Grosso regular o uso e a ocupação do solo. A ausência de regras tem se mostrado mais favorável aos interesses dos grandes produtores rurais.

Os povos do Xingu vem contribuindo de maneira cada vez mais decisiva com o desenvolvimento regional, com sensatez e visão de futuro. A cada ano, ampliam sua participação nos espaços de tomada de decisão, se organizam para defenderem seus direitos e contam com o apoio da sociedade civil organizada que, assim como eles, almeja um futuro de rios limpos, florestas em pé e diversidade política e cultural”, afirma Ivã Bocchini, coordenador-adjunto do Programa Xingu do ISA.

 

Fonte: Instituto Socioambiental

Para mais notícias sobre Desenvolvimento Inclusivo e Sustentável, acesse aqui.

Aprovação do PL 2630 é fundamental para regular plataformas e defender a democracia brasileira

Compartilhe

Com o crescente debate em torno das declarações e ações de Elon Musk, bilionário e proprietário da rede social X, a Coalizão Direitos na Rede e demais entidades que subscrevem a presente carta aberta expressam sua profunda indignação diante da postura de Musk e preocupação em relação aos desdobramentos desse caso. Manifestamos preocupação também com a criação, na Câmara dos Deputados, de um Grupo de Trabalho para tratar do Projeto de Lei 2630. Consideramos que o texto representa anos de debates e acordos possíveis entre diferentes setores. Somos uma coalizão dedicada à defesa dos direitos humanos e à promoção de um ambiente digital inclusivo e democrático, esperamos que o Brasil vote o PL e garanta mecanismos de transparência na operação das plataformas, fundamental para a defesa da democracia.

Os ataques de Elon Musk contra o presidente Lula e o ministro Alexandre de Moraes se somam a um quadro de questionamento da legitimidade das eleições brasileiras de 2022, falta de transparência generalizada, abusos na moderação de conteúdo e propagação de conteúdos problemáticos, como mensagens desinformativas e de discurso de ódio  por parte de Musk/X. Tudo isso mostra a necessidade de termos regras que estabeleçam procedimentos que garantam direitos e deveres na rede, tornando-a mais transparente e pautada pela responsabilidade social, caminho que o Brasil tem buscado trilhar desde a aprovação do Marco Civil da Internet.

O PL 2630 vem sendo debatido desde 2020, tendo sido objeto de dezenas de audiências e centenas de contribuições de especialistas na matéria. O amadurecimento brasileiro na discussão sobre regulação de plataformas precisa ser reconhecido para a aprovação de uma lei que esteja atenta às nossas especificidades e contribua para o respeito às instituições democráticas e a nossa soberania. O projeto cria obrigações de transparência sobre as plataformas, amplia hipóteses de responsabilização desses agentes, fixa direitos dos usuários para garantir a liberdade de expressão, estabelece sanções e instituições reguladoras participativas para a fiscalização e aplicação de punições na esfera administrativa, em complemento ao necessário papel do Judiciário. Infelizmente, a aprovação do PL tem sido bloqueada pelo intenso lobby das plataformas e pela resistência da extrema-direita, que usa a desculpa da liberdade de expressão para favorecer corporações e manter a liberdade de difundir conteúdos desinformativos e de ódio.

É fundamental ressaltar e destacar os esforços do relator Orlando Silva (PCdoB) na busca de um texto que dialogue com as diversas preocupações manifestadas pela sociedade civil. O parlamentar tem demonstrado um engajamento significativo na construção de regras que garantam direitos na rede, desde o Marco Civil da Internet, com reconhecida dedicação em ouvir as diversas vozes da sociedade e encontrar medidas adequadas para regular o ambiente digital de forma equilibrada e justa. Seu compromisso com a pauta, conhecimento do texto e capacidade de articulação são elementos que sustentam sua importância e nossa defesa de mantê-lo como relator do PL.

Regulação é caminho para soberania

O crescimento da extrema direita em diversos países é facilitado pela lógica de funcionamento das plataformas, seja por não adotarem critérios para a proliferação de mensagens pagas, por construírem bolhas algorítmicas ou por não efetivarem uma moderação responsável de conteúdos online. O caso de Musk não é diferente, uma vez que o dono da plataforma X tem sido denunciado há anos por ser apoiador de ideais conservadores e cooperar com regimes autocráticos ou autoritários, como ocorre em países como a Índia. Esse quadro é ainda mais preocupante porque teremos, em 2024, dezenas de eleições em todo o mundo que sofrem com os efeitos da plataformização desregulada sobre o debate público. É preciso enfrentar um cenário em que as plataformas deixam de implementar medidas necessárias para proteger processos democráticos contra a desinformação, o discurso de ódio e outros problemas, ao passo que seguem lucrando com eles.

É inegável que as declarações de Musk, sugerindo uma disposição de desrespeitar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), representem um ataque direto ao Estado Democrático de Direito e à independência do Judiciário. Essa atitude não apenas compromete a integridade do sistema democrático brasileiro, mas também evidencia uma preocupante interferência estrangeira nos assuntos internos do país, minando sua soberania. A preocupação com a soberania digital se estende também às infraestruturas de conectividade, especialmente em regiões tão estratégicas como a Amazônia. Depender unicamente da Starlink de Elon Musk para garantir a conectividade nessas áreas pode criar uma vulnerabilidade significativa, sujeitando a região a interferências externas adversas ao interesse público, e a um abuso de poder econômico sobre uma área tão fundamental para o país.

Atualmente, cinco grandes plataformas digitais controlam a circulação de conteúdos na Internet e, consequentemente, nos espaços de debate e participação online. O desdém da plataforma X com o ordenamento jurídico brasileiro é mais um sinal da crise de equidade global associada às empresas de Big Tech e sedimenta a hipótese de que estas se importam apenas com os países do Norte Global. Esses mesmos países atuam, inclusive, de maneira mais inicisiva por meio de regulações como o DSA e o DMA na Europa e por medidas de autoridades regulatórias como o Federal Trade Commission (FTC) dos Estados Unidos. O atendimento a ordens judiciais e observância às normas locais devem ser feitos em todos os países do mundo.

Os acontecimentos destacados na presente carta demonstram a importância de avançar na construção de uma regulação para plataformas digitais no Brasil e a sua centralidade na manutenção da democracia. Estabelecer parâmetros de transparência e do devido processo constitui, portanto, passo fundamental para garantirmos um ecossistema digital confiável, atento à integridade da informação, num contexto de extrema digitalização, inclusive, dos nossos processos democráticos.

Por fim, além de avançar na regulação das plataformas digitais, o Brasil precisa discutir com a população e efetivar políticas públicas capazes de promover sua soberania digital, a exemplo da manutenção de infraestruturas públicas para guarda de dados e de promoção de plataformas transparentes que funcionem para atender as necessidades locais e com vistas à promoção de direitos. O modelo atual das plataformas, a maior parte estadunidense, é voltado essencialmente à garantia de lucros, por isso o desenvolvimento de todo um mecanismo de captura de atenção e produção de audiência que é trocada por publicidade. Se não quisermos que esse modelo seja o único e paute a internet, precisamos construir alternativas.

Democracia e soberania são palavras que expressam enormes desafios para o Brasil e diversos outros países no momento atual. Precisamos dar passos para a garantia desses dois princípios fundamentais e a aprovação do PL 2630 é um deles. Regulação já!

Assine a carta!

 

Fonte: FNDC

Para mais notícias sobre Políticas Públicas de Comunicação, acesse aqui.